Evaluation of the efficiency of density measurement with lactodensimeter for identification of adulteration by watering in milk
Revista Higiene Alimentar, 34 (290) : 118-125, jan/jun, 2020. DOI 10.37585/HA2020.eficiencia
Mariana Surmani Oliveira
Centro Universitário do Norte Paulista. São José do Rio Preto, SP
marysurmani@hotmail.com
Prof. Dr. José Erick Galindo Gomes
Centro Universitário do Norte Paulista. São José do Rio Preto, SP
josegomes@unorp.br
Profa. Dra. Bruna Maria Salotti de Souza
Universidade Federal de Minas Gerais, Departamento de Tecnologia e Inspeção de Produtos de Origem Animal. Belo Horizonte, MG
brunamss@ufmg.br
RESUMO: O leite é o segundo alimento mais fraudado no mundo, sendo as fraudes mais frequentes aquelas que têm por objetivo aumentar o volume de leite e mascarar a acidez produzida, com base nisso, o presente trabalho teve por objetivo analisar a eficiência das provas de densidade e acidez Dornic para verificar a presença de fraudes no leite. O leite cru refrigerado proveniente de duas propriedades rurais foi adulterado de forma a obter-se sete amostras: sendo a amostra A1 o controle (leite cru integral refrigerado) e as demais com a substituição parcial de volume de leite por água, sendo A2 substituição de 2% de leite por 2% de água, A3 de 4%, A4 de 6%, A5 de 8%, A6 de 10% e A7 de 12%. As análises de densidade e acidez titulável identificaram uma diferença significativa no leite com substituição já de 2% por água, porém os valores encontrados em ambas as análises não foram superiores ao intervalo de valores estabelecidos pela legislação, exceto a densidade relativa em uma propriedade que foi alterada quando a 10% de substituição. O presente trabalho demonstrou, portanto, uma baixa eficiência das provas avaliadas em detectar a adulteração do leite pela adição de pequenas quantidades de água.
Palavras-chave: Densidade. Leite. Qualidade.
ABSTRACT: Milk is the second most fraudulent food in the world, and the most frequent frauds are those that aim to increase the volume of milk and mask the acidity produced by them. Based on this, the present work aimed to analyze the efficiency of the tastings. Dornic density and acidity to check for milk fraud. Chilled raw milk from two farms was tampered with in order to obtain seven samples: sample A1 being the control (chilled completely raw milk) and the others with partial replacement of milk volume with water, and A2 substituting 2% of milk by 2% water, 4% A3, 6% A4, 8% A5, 10% A6 and 12% A7. The analyzes of density and treatable acidity identified a significant difference in milk with substitution of 2% already by water, but the values found in both analyzes were not higher than the range established by legislation, except the relative density in a property that was changed when the 10% replacement. Therefore, the present work demonstrated a low efficiency of the evaluated tests to detect milk adulteration by the addition of small amounts of water.
Keywords: Density. Milk. Quality
INTRODUÇÃO
O sol abundante, água e terra, fazem com que o Brasil seja um dos maiores produtores de alimentos no mundo (CAMARGO et al., 2017). Estima-se que em 35 anos o país será responsável pela produção de 40% dos alimentos que serão consumidos por uma população de nove milhões de pessoas (TIBOLA et al., 2018).
A grande quantidade de alimentos exportados, importados e de alto valor agregado produzidos pelo Brasil, fazem com que as oportunidades de fraudes e adulterações de alimentos sejam crescentes. A ocorrência de fraudes e adulterações provocam a perda de confiança por parte de investidores, clientes, consumidores e autoridades do país (TIBOLA et al., 2018).
A fraude e adulteração são definidas como a substituição deliberada, adição, adulteração ou deturpação de alimentos ou ingredientes alimentares para ganho econômico (FAO, 2017). A fraude e adulteração dos alimentos podem ameaçar a segurança alimentar e mesmo afetar negativamente o desempenho nutricional dos alimentos, trazendo prejuízos aos consumidores.
Tibola et al (2018), identificaram 42 registros de fraudes e adulterações de alimentos no Brasil de 2007 a 2017 e relataram que o leite e seus derivados (38%) foram os principais alvos de adulterações no Brasil. Fraude em leite pode ser entendida como a intenção de se obter ganho econômico com a adição, substituição ou adulteração de forma a deturpar o produto, (CRUZ et al., 2019).
O leite é o segundo alimento mais fraudado no mundo, sendo as mais frequentes as que têm por objetivo aumentar o volume de leite e reconstituir suas características frente às provas oficiais, matar micro-organismos que alteram o leite ou mesmo mascarar a acidez produzida por eles (CRUZ et al., 2019).
A produção de leite no Brasil mantém atualmente o crescimento gradativo, porém o baixo preço pago e a desvalorização dos produtores, além do alto custo de produção vem sendo um dos motivos para ocorrência de fraudes no leite, visando o aumento no rendimento do produto (CRUZ, SANTOS, 2009).
O leite é um alimento de origem biológica, que possui sabor suave e próprio, agradável e ligeiramente adocicado, amplamente consumido pela população. Trata-se de um produto constituído de proteínas, carboidratos, ácidos graxos, sais minerais, vitaminas e água, constituintes estes que podem ser facilmente alterados nos casos de fraudes (GOULART, 2003; GARRIDO et al., 2001; SILVA et al., 2008).
Com base no exposto o presente trabalho teve por objetivo analisar a eficiência da medição da densidade com lactodensímetro no leite para verificar a ocorrência de fraude pela adição de água.
MATERIAL E MÉTODOS
O trabalho foi desenvolvido no Laboratório Multidisciplinar, do Centro Universitário do Norte Paulista – Unorp. O leite foi adquirido de duas propriedades rurais localizadas no município de Irapuã, São Paulo, Brasil, com produção diária de aproximadamente 90 litros de leite por dia.
A água destilada adicionada para realização das diluições apresentava-se com pH de 6,12, estando dentro dos padrões estabelecidos de potabilidade da água, conforme Portaria 5/2017 (BRASIL, 2017).
As avaliações foram realizadas adulterando-se o leite de forma a obter-se sete amostras: sendo a amostra A1 o controle, ou seja, leite cru integral refrigerado, e as demais com a substituição parcial de volume de leite por água, sendo A2 substituição de 2% de leite por 2% de água, A3 de 4%, A4 de 6%, A5 de 8%, A6 de 10% e A7 de 12%. Na avaliação das amostras foram realizadas três repetições e foram analisadas cinco amostras de leite de cada propriedade, durante o período de fevereiro a julho de 2019.
Determinação de densidade a 15 °C
Para realização da determinação de densidade, foi necessário transferir para uma proveta de 250 mL, uma quantidade de leite previamente homogeneizada e resfriada, que permitiu introduzir o lactodensímetro calibrado Quevenne, com temperatura que variou de 10 a 20 °C, sendo esta verificada pelo termômetro digital portátil tipo espeto (-45~230 °C).
O lactodensímetro foi introduzido lentamente, evitando mergulhá-lo além do ponto de afloramento e tendo o cuidado de não encostar nas paredes da proveta. A leitura foi realizada ao nível do leite no menisco superior. Para se obter o valor de densidade corrigida a 15 °C foi utilizada a tabela 1 do capítulo XXVII do Normas Analíticas do Instituto Adolfo Lutz. Os valores de densidade não contidos na respectiva tabela foram feitos a correção da leitura acrescentando 0,0002 a cada grau acima de 15 °C ou diminuindo 0,0002 para cada grau abaixo de 15 °C (IAL, 2005).
Determinação de acidez em graus Dornic
Com o auxílio de uma pipeta volumétrica, foi transferido 10 mL da amostra de leite a ser testada para um béquer de 100 mL, posteriormente foram adicionadas três gotas da solução de fenoftaleína e a titulação ocorreu com a solução de hidróxido de sódio N/9 (Dinâmica®), utilizando uma bureta de 10 mL até o aparecimento de uma coloração rósea. Cada 0,1 mL de solução de hidróxido de sódio N/9 equivale a 1 °D (IAL, 2005).
Análise Estatística
Os resultados obtidos nas diferenças das porcentagens de água e entre as propriedades foram submetidos às análises de variância e teste de média, teste t e teste de Tukey, respectivamente, a 5% de probabilidade, utilizando-se o programa SPSS Statistics.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Atualmente em vigor no Brasil, a Instrução Normativa 76/2018, estabelece como valores permitidos para densidade relativa a 15 °C/15 °C e acidez titulável de leite cru refrigerado recebido na indústria de beneficiamento, de 1,028 a 1,034 g/mL e 0,14 a 0,18 g ácido lático/100mL, que corresponde 14 a 18 °D, respectivamente (BRASIL, 2018).
O aumento de volume proporcionado pela adição da água ao leite, provoca uma diminuição do valor da densidade, isso é confirmado na tabela 1, onde houve uma redução de 0,004 g/mL no valor expresso de densidade, do leite sem adição de água (A1) para o leite com adição de 12% de água (A7), em ambas as propriedades.
A propriedade 1 apresentou resultados de densidade dentro dos padrões estabelecidos pela legislação vigente em todas as amostras analisadas, já a propriedade 2 apresentou valores inferiores ao limite estabelecido pela legislação nas amostras que receberam 10 e 12% de água (A6 e A7), porém a densidade inicial desta propriedade doi inferior a propriedade 1. Além disso, na propriedade 1, somente com a adição de 6% de água é que ocorre uma diferença significativa dos valores de densidade, já na propriedade 2 na adição de 2% de água já é possível identificar uma diferença significativa no resultado.
Cruz e Santos (2009), identificaram valores inferiores ao estabelecido pela legislação quando somente na adição de 12% de água, quando a densidade foi de 1,026 g/mL, resultado semelhante ao presente estudo quando comparado a propriedade 2.
Dentre as fraudes identificadas no leite fluido, a adição de água é o método mais antigo e comumente utilizado principalmente em pequenas propriedades rurais, que além de lesar o consumidor, estabelece um risco a saúde do mesmo, pois a água adicionada muitas vezes não recebe qualquer tratamento e pode aumentar a contaminação do produto com micro-organismos patogênicos (CRUZ e SANTOS, 2009). Além disso, a adição de água ao leite reduz de forma significativa o seu valor nutritivo, sendo que algumas análises físicas e químicas, como o índice de crioscopia, densidade, acidez e teor de sólidos não gordurosos podem caracterizar a suspeita de adição de água (ABRANTES et al., 2014).
Breitenbach et al. (2018), entrevistaram 1015 consumidores de leite do sul do Brasil com o objetivo de identificar o entendimento destes em relação as fraudes na cadeia produtiva do leite e identificaram que 80% dos consumidores entrevistados na amostra, não reduziram nem levemente consumo de leite. Além disso identificaram que 14,7% iniciaram a aquisição de leite informal após as fraudes serem divulgadas na mídia. Brandão et al (2015) relatam que o mercado informal se torna uma alternativa de consumo quando o mercado formal é desacreditado.
Breitenbach e Souza (2015) concluíram que a principal causa de fraudes no leite estaria relacionada ao aumento da concorrência entre as indústrias de laticínio, o que acarretaria em uma redução de lucros e a fraude se tornaria uma estratégia para aumentar ganhos financeiros.
Para Ulberth (2020) a causa raiz da ocorrência de fraude alimentar é totalmente diferente do conhecimento estabelecido sobre segurança alimentar, sendo que a força motriz da adulteração de alimentos de forma geral, visa maximizar as receitas usando um ingrediente barato para parcialmente substituir um mais caro ou parcialmente remover o componente de maior valor na esperança de que o produto alterado passe despercebido pelo consumidor final.
O leite cru refrigerado (A1) analisado da propriedade 1, apresentou acidez titulável superior ao estabelecido pela legislação vigente, sendo este indicativo de alta contagem de micro-organismos aeróbios mesófilos que metabolizam lactose e produzem ácido lático. A prova de acidez titulável é realizada promovendo uma neutralização do ácido lático, sendo assim quando esta apresenta-se com valores superiores pode-se afirmar a acidez de origem microbiana como mostra na tabela 2. Esse aumento de acidez identificado na acidez titulável pode estar relacionado a deficiência na higiene no procedimento de ordenha, falta de refrigeração do leite e até mesmo transporte sem refrigeração.
Quando se inicia a adição de 2% de água (A2), a amostra da propriedade 1 já apresenta uma redução de 2,26 °D e na propriedade 2 uma redução de 0,70 °D e esta redução se intensifica gradativamente e com diferença estatisticamente significativa.
Em ambas as propriedades a adição de água provocou, portanto, uma redução na acidez titulável, porém não o suficiente para que as mesmas apresentassem valores inferiores ao estabelecido pela legislação vigente, estando na amostra A7 da propriedade 1 em 14,53 °D e na propriedade 2 em 15,00 °D.
CONCLUSÃO
A partir das análises realizadas foi possível concluir que a substituição de leite por água promove alteração nos resultados de densidade e acidez titulável, porém mesmo com substituições de 12% de água não houve alteração dos resultados de acidez titulável em ambas as propriedades analisadas para que estivessem em desacordo com o estabelecido pela legislação, assim como a densidade na propriedade 1, sendo esta alterada para valores inferiores ao estabelecido pela legislação somente a partir de substituição de 10% de água na propriedade 2. A aplicação de outras metodologias é interessante para que se detecte outras possíveis fraudes que mascaram a redução da densidade pela adição de água como por exemplo a incorporação de amido que proporciona um aumento de peso do leite e consequente aumento de densidade.
Tabela 1: Resultados da análise de densidade do leite fluido, nas diferentes propriedades e com diferentes proporções de água.
TRATAMENTOS | DENSIDADE (g/mL) | |
PROPRIEDADE 1 | PROPRIEDADE 2 | |
A1 | 1,034a ± 0,001 | 1,030a ± 0,001 |
A2 | 1,034ab ± 0,001 | 1,029b ± 0,001 |
A3 | 1,033ab ± 0,001 | 1,028c ± 0,000 |
A4 | 1,033bc ± 0,001 | 1,028c ± 0,000 |
A5 | 1,031cd ± 0,002 | 1,028d ± 0,000 |
A6 | 1,031d ± 0,001 | 1,027e ± 0,000 |
A7 | 1,030d ± 0,001 | 1,026f ± 0,000 |
A1 – controle, A2 – 2% de água, A3 – 4% de água, A4 – 6% de água, A5 – 8% de água, A6 – 10% de água e A7 – 12% de água. Letras minúsculas diferentes indicam diferença estatística entre as médias das amostras na mesma coluna, utilizando o teste de Tukey (P < 0,05). Os resultados são expressos como média ± DP.
Tabela 2: Resultados da análise de acidez titulável (°D) do leite fluido, nas diferentes propriedades e com diferentes proporções de água.
TRATAMENTOS | ACIDEZ DORNIC (°D) | |
PROPRIEDADE 1 | PROPRIEDADE 2 | |
A1 | 19,13a ± 0,92 | 17,70a ± 0,90 |
A2 | 16,87b ± 1,13 | 17,00ab ± 0,57 |
A3 | 16,33b ± 1,23 | 16,30bc ± 0,46 |
A4 | 16,60b ± 1,18 | 16,20cd ± 0,56 |
A5 | 15,80b ± 1,37 | 15,87cd ± 0,83 |
A6 | 15,93b ± 0,80 | 15,43de ± 0,62 |
A7 | 14,53c ± 1,06 | 15,00e ± 0,85 |
A1 – controle, A2 – 2% de água, A3 – 4% de água, A4 – 6% de água, A5 – 8% de água, A6 – 10% de água e A7 – 12% de água. Letras minúsculas diferentes indicam diferença estatística entre as médias das amostras na mesma coluna, utilizando o teste de Tukey (P < 0,05). Os resultados são expressos como média ± DP.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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