Comemorado em 16 de outubro, para relembrar a data da criação da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), em 1945, o Dia Mundial da Alimentação tem por objetivo instigar uma reflexão a respeito do quadro atual da alimentação mundial e principalmente sobre a fome no planeta. A cada ano é definido um tema e, a partir dele, diversas atividades artísticas, esportivas e acadêmicas vão sendo realizadas ao redor do mundo.
Neste ano, a temática escolhida aborda o compromisso assumido pela comunidade internacional em erradicar todas as formas de desnutrição, por ocasião da aprovação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, em 2015, quando representantes dos 193 Estados-Membros das Nações Unidas consideraram que a erradicação da fome e todas as formas de desnutrição é condição essencial para um mundo mais seguro, mais justo e mais pacífico.
Na ocasião, líderes mundiais reuniram-se na sede da ONU, em Nova York, e estabeleceram um plano de ação para erradicar a pobreza, proteger o planeta e garantir que as pessoas alcancem a paz e a prosperidade. Para tanto foram formulados 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) a serem alcançados por meio de uma lista de tarefas que deverão ser cumpridas até 2030. (O documentoTransformando o Nosso Mundo: A Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável pode ser visualizado no site http://www.agenda2030.com. br/.)
Para a implementação da Agenda 2030 foram estabelecidas ações em áreas de importância crucial para a humanidade: Pessoas, Planeta, Prosperidade, Paz e Parcerias. E, conforme previsto no documento elaborado em 2015, essas ações devem ser desenvolvidas por toda a sociedade, visando atender às 169 metas que permitirão atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, os quais contemplam as dimensões econômica, social e ambiental.
“Acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e a melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável” é o segundo dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, cujas metas são apresentadas no quadro 1. Embora ainda faltem 12 anos para o prazo final da implementação da Agenda, a situação é preocupante, uma vez que os números revelam um crescimento das condições que deveriam estar sendo extinguidas, tais como a fome, a desnutrição e as adversidades climáticas.
Segundo artigo do diretor-geral da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), José Graziano da Silva, desde 2015, quando foi aprovada a Agenda 2030, a fome não parou de crescer. Em 2017, 821 milhões de pessoas passaram fome, o que corresponde a 11% da população mundial (uma em cada nove pessoas no planeta) e 1,5 bilhões de pessoas sofriam de deficiência de micronutrientes.
É importante considerar que o conceito Fome Zero é muito amplo e não se resume a acabar com a desnutrição, mas também garantir que todos tenham acesso a uma alimentação saudável. Nesse contexto não se pode deixar de refletir sobre o aumento descontrolado da obesidade, com proporções alarmantes, haja vista que o número de adultos obesos no mundo subiu de 11,7% em 2012 para 13,3% em 2016, correspondendo a 672 milhões de pessoas. Entre as crianças menores de 5 anos, 38 milhões apresentam excesso de peso e, paradoxalmente, tanto em relação à desnutrição, quanto à obesidade, a maioria dos casos encontra-se na Ásia e na África.
No Brasil, a situação também é preocupante. Conforme dados da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção de Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), divulgada este ano, a obesidade já é considerada um problema de saúde pública pois atinge 18,9% dos brasileiros e o sobrepeso é uma realidade para mais da metade da população, 54%. Entre os jovens a obesidade aumentou 110% nos últimos dez anos.
No outro extremo, mais de 52 milhões de brasileiros vivem na pobreza, em estado de insegurança alimentar. Segundo indicadores do IBGE publicados em 2017, 7,2 milhões de brasileiros não têm acesso diário à comida de qualidade e na quantidade necessária e isso em um país que é o 3º maior produtor de alimentos do mundo. Está claro que, aumentar a produção de alimentos não basta para garantir o acesso dos alimentos a todos. E, embora os sistemas produtivos atuais tenham promovido maior produtividade e eficiência na produção de alimentos, esses sistemas vêm reduzindo a capacidade de recuperação dos solos, desregulação da dinâmica hídrica e redução da biodiversidade, o que pode pôr em risco a produção de alimentos nas próximas décadas, em função da escassez dos recursos naturais.
Os recursos devem, portanto, ser preservados e muito bem utilizados, para não gerar redução da oferta de alimentos por sua eventual escassez, conforme estabelecido em uma das metas do segundo objetivo do desenvolvimento sustentável, quer seja, garantir sistemas sustentáveis de produção. No entanto, um terço de toda a produção alimentar do mundo é desperdiçada diariamente, cerca de 1,3 bilhão de toneladas de comida descartada por ano, segundo estimativas da FAO. As perdas ocorrem em todas as etapas da cadeia alimentar por motivos variados, como falta de infraestrutura e de tecnologia em algumas regiões, hábitos de consumo e abundância de oferta em outras, mas é fato que o desperdício compreende o descarte intencional dos alimentos, o que é inconcebível, já que na produção desse rejeito também foram dispendidos recursos naturais essenciais para nossa sobrevivência.
Resultados da pesquisa sobre hábitos de consumo e desperdício de alimentos apresentada durante o “Seminário Internacional União Europeia – Brasil: Perdas e desperdício de alimentos em cadeias agroalimentares: oportunidades para políticas públicas”, demonstram que 41,6 kg de comida são desperdiçados por pessoa a cada ano no Brasil, justificando-se esse comportamento pela valorização da fartura, assumindo-se entre os pesquisados, que “é sempre melhor sobrar do que faltar”, conforme dados da Embrapa.
Esses dados demonstram que alcançar os objetivos do desenvolvimento sustentável com segurança alimentar e nutricional para todas as pessoas em um mundo sustentável, depende de um esforço conjunto de todos os envolvidos no sistema alimentar, com comprometimento do governo, sociedade civil, setor privado e todos os cidadãos. Somente assim será possível atingir Fome Zero em 2030, conforme nos lembra o lema deste Dia Mundial da Alimentação
Sílvia Panetta Nascimento
Editoria científica Higiene Alimentar
Faculdade de Tecnologia de Itapetininga
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