Nobel de física ensina outro jeito de cozinhar macarrão -e irrita italianos

Deixar a água ferver, jogar sal e espalhar o macarrão, para que cozinhe de maneira uniforme por um determinado tempo, com a panela destampada e o fogo ligado. Esse é o método correto para começar uma macarronada, certo?

Não para o físico italiano Giorgio Parisi, ganhador do Prêmio Nobel de 2021, que compartilhou uma forma de levar mais eficiência e economia de gás ao processo, usando a ciência.

Segundo ele, é possível obter o ponto perfeito da massa ao cozinhá-la com o fogo bem baixo. “O mais importante é manter a tampa”, diz. “O macarrão é bem cozido mesmo nas montanhas, com a água fervendo a 90 graus.”

O que está rolando?

A ideia surgiu após governo local solicitar que os cidadãos diminuam o consumo de gás. O fornecimento foi reduzido pela Gazprom, empresa de energia russa, após o início da guerra com a Ucrânia.

De acordo com a Forbes, um italiano consome em média 23,5 kg de macarrão por ano, o que seria responsável por uma parcela significativa do uso de gás no país, já que a água precisa atingir e se manter em altas temperaturas.

Dentro desse quadro, Parisi decidiu compartilhar em sua página do Facebook a publicação do arquiteto Alessandro Busiri Vici, que afirma que é possível até mesmo desligar o fogo e manter a panela com a tampa fechada para que a massa chegue ao ponto correto — ele chama o procedimento de “cozimento passivo”.

Economiza mesmo o gás?

Na prática, seria possível, sim, economizar gás com o método destacado pelo ganhador do Prêmio Nobel.

A União Alimentar Italiana afirmou que os italianos que adotarem essa alternativa para cozinhar poderão economizar até 47% da energia consumida atualmente, de acordo com o jornal The Independent.

O professor de física Fred Zenorini, autor do projeto Física no Fusca, explica a Tilt que isso ocorre, pois o gasto de energia para fazer a água ferver é maior do que a energia necessária para só alterar a sua temperatura (como manter o fogo baixo durante toda a cocção).

Para conseguir chegar ao estado gasoso, é preciso romper as interações intermoleculares da água, que são as chamadas de ligações de hidrogênio. Essas interligações são bastantes fortes, por isso se gasta mais gás para ferve-la, destaca.

A receita da economia

De acordo com o site ScienceAlert, ao colocarmos a massa seca na panela com a água fervendo, o líquido penetra no macarrão, reidratando-o. Isso o faz amolecer — além de aquecer a massa.

No caso de manter o fogo sempre baixo, dois pontos são fundamentais para que dê certo: esperar a água retornar ao ponto de ebulição após colocar o macarrão, e manter a tampa fechada até que a massa chegue ao ponto desejado.

O primeiro detalhe ocorre devido à troca de temperatura. Apesar de a água estar fervendo, o macarrão está em temperatura ambiente. Logo, vai resfriar a água.

“O conjunto água e macarrão vai ficar um pouco abaixo da temperatura de ebulição, então vai demorar um tempo [por isso a ideia de 2 minutos] para o conjunto voltar a atingir a temperatura de ebulição da água novamente”, explica Fred Zenorini.

Já a tampa é fator fundamental para fazer com que o calor se dissipe mais lentamente. O professor explica que são três formas para a dissipação do calor: condução, convecção e radiação. As duas primeiras são afetadas pela tampa durante o processo.

“A convecção térmica ocorre quando o calor se dissipa por diferença de densidade, ou seja, o ar quente sobe, o ar frio desce. O fato de você tampar a panela ajuda o calor a se dissipar menos por convecção”, diz Zenorini.

“O outro mecanismo é a condução do calor, que se dá por meio de choque entre as partículas — o fato de a panela estar tampada também ajuda um pouco”, diz ele. “Na minha opinião, entre os três mecanismos, a convecção térmica é a que mais é afetada pelo fato de a panela estar tampada, fazendo com que o calor se dissipe mais lentamente”, explica.

Uma dica extra é usar uma panela de ferro, mais grossa. Ela reterá o calor por mais tempo, conclui o professor.

Método não agradou todo mundo

As estratégias de cozimento do físico e do arquiteto não agradaram muito o público do país, reconhecido por ter o macarrão como uma paixão nacional.

Ao La Repubblica, o chef Antonello Colonna, que possui um restaurante com uma estrela Michelin, contestou a afirmação, dizendo que o método deixaria a massa emborrachada.

“Lembro-me bem quando na casa dos meus pais o botijão de gás acabou quando o espaguete estava cozinhando. E quando isso aconteceu, [nós] estávamos com problemas, porque a consistência do produto agora estava comprometida”, disse ele.

O chef Luigi Pomata afirmou que “seria um desastre”.

“Vamos deixar a cozinha para os chefs, enquanto os físicos fazem experimentos em seus laboratórios”, acrescentou.

 

Felipe Mendes. 

Colaboração para Tilt, em São Paulo

Fonte: Tilt uol, 2023

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