Dry aged: Um estudo com consumidores brasileiros sobre a cor e a qualidade da carne maturada a seco.

O fenômeno da “Gourmetização” e a procura por carnes de qualidade está ganhando nos dias atuais mais espaço no prato do consumidor mundial.

Uma maior diversidade de produtos nos mercados, a abertura de boutiques de carnes especializadas, as postagens nas redes sociais, são alguns dos exemplos dos dias atuais que refletem a ascensão deste nicho de mercado no mundo. Dentre estes produtos, um que se tem destacado bastante é a linha de carnes maturadas.

Mas o que é a maturação?

A maturação é um processo natural de amaciamento, que se inicia logo após o abate, transformando músculo em carne. Durante a maturação, a estrutura das fibras musculares sofre degradação por um complexo de enzimas (calpaínas e catépsinas) produzidas pelo próprio músculo, que irão resultar em mudanças no sabor e maciez do produto final.

No Brasil, para se atender as demandas higiênico-sanitárias, as carcaças passam por um processo de maturação onde são resfriadas (±2-4° C) por no mínimo 24 horas antes de serem comercializadas. Portanto, qualquer carne que seja comprada (a granel no açougue ou embalada à vácuo), desde que se tenha o selo do SIF (Sistema de Inspeção Federal) possui algum tempo de refrigeração.

Além da maturação sanitária, uma prática já bastante comum em países norte-americanos, europeus e agora no Brasil é a maturação comercial. A maturação comercial tem como objetivo padronizar as características sensoriais (cor, sabor, maciez) da carne, que devido a grande diversidade de raças, sistemas de produção e dietas, é por si só um produto bastante heterogêneo.

Existem dois tipos de maturação comercial: a maturação a vácuo ou úmida na qual a carne é embalada e mantida refrigerada (14 a 21 dias) e a maturação a seco ou dry-aged na qual a carne não é embalada e é mantida exposta ao ar em condições de temperatura e umidade controlada por períodos mais prolongados.

A maturação a seco (dry-aged) é um processo mais tradicional, longo e de alto custo, que foi substituído pela maturação úmida, devido ao surgimento de embalagens a vácuo, que facilitaram o processo de estocagem e transporte.

Outra desvantagem do dry-aged são as perdas consideráveis de rendimento (>30% do peso original) devido a secagem e a necessidade da remoção da superfície ressecada da carne. Entretanto, devido aos seus melhores atributos sensoriais, em especial a concentração de sabores, incorporados a carne, trouxeram de volta este produto ao mercado.

O sabor amanteigado ou de amêndoas, característico do dry-aged, pode ser obtido a partir de 28 dias de maturação. Entretanto em alguns estabelecimentos este processo pode chegar até seis meses. As mudanças de sabor da carne são as resultantes da perda de água, da atividade dos microrganismos e da crosta formada na superfície. Além da maciez e do sabor a maturação a seco também pode alterar a coloração da carne.

Dentre as características sensoriais (cor, a maciez e o flavor = a soma entre sabor e aroma) a cor é a única característica no qual o consumidor é capaz de avaliar antes de consumir o produto, sendo desta forma, o atributo mais importante na hora da compra.

No caso da carne, a cor vermelha brilhante é responsável por despertar o desejo de consumir ou rejeitar o produto. Entretanto, a coloração da carne pode mudar dependendo do estado químico da mioglobina, o principal pigmento da carne.

Em ambientes com baixa quantidade de oxigênio, por exemplo, quando a carne acaba de ser cortada, ela irá apresentar uma coloração vermelho púrpura. Em seguida ao entrar em contato com oxigênio (entre 15 e 30 min) ela irá apresentar a coloração vermelha brilhante, que é mais atrativa.

Entretanto ao passar longos períodos em contato com oxigênio (geralmente entre 5 a 6 dias para carnes resfriadas e embaladas em bandeja), a mioglobina é oxidada e irá mudar sua coloração para castanho.

Todavia, ao se falar no dry aged, ainda pouco se sabe sobre as mudanças na coloração e na aceitabilidade desta carne no Brasil. Desta forma, mais estudos com consumidores brasileiros ainda são necessários.

Neste sentido, recentemente o grupo de pesquisa em Nutrição e Qualidade de Carne da Universidade Estadual de Maringá, no Paraná, sob orientação do Prof. Dr. Ivanor Nunes do Prado, desenvolveu um trabalho em que avaliaram a aceitabilidade da carne de novilhos super precoce da raça Nelore terminados em confinamento e maturadas a seco por até 28 dias de duas formas:

Avaliando a cor e simulando as condições na hora da compra no varejo;
Sensorialmente, através de prova de degustação.

Para avaliar a coloração, as carnes maturadas foram embaladas em bandejas, refrigeradas e deixadas em exposição de luz (12 h) por 10 dias em um expositor comercial. Foram avaliadas com uso de instrumentos a coloração e a oxidação lipídica e também visualmente, com um grupo de 20 consumidores semi treinados, avaliando as fotografias das carnes.

Para as outras características sensoriais: maciez, sabor (flavor) e aceitabilidade global), um grupo de 120 consumidores realizou um questionário e participaram de uma prova de degustaão.

Os dados instrumentais da cor se observou que as carnes maturadas a seco eram mais escuras, com maior intensidade de tons vermelhos e apresentaram uma maior oxidação lipídica. Isso pode ser explicado devido desnaturação das fibras durante a maturação a seco, resultando em uma maior perda de água e uma redução da luminosidade.

Quando avaliadas visualmente, as carnes maturadas por 28 dias apresentaram baixos valores de aceitabilidade (<5 pontos); enquanto que, carnes não maturadas e maturadas por 14 dias foram bem aceitas por até 5 e 3 dias respectivamente.

Para a prova sensorial de degustação, foi aplicado um questionário que revelou que 75% dos consumidores ainda preferem a compra de carne no açougue, a granel. Para avaliação do flavor (soma do sabor e aroma) as notas de aceitabilidade foram altas, mas não foram diferentes entre os tempos de maturação. Por outro lado, para as notas de maciez e aceitabilidade geral, estas foram maiores para carnes maturadas por 28 dias e intermediárias para carnes maturadas por 14 dias.

A partir deste estudo pode-se concluir que a cor da carne não maturada é mais atrativa do que a carne maturada a seco para os consumidores brasileiros, o que é muito importante uma vez que grande parte da população ainda compra carne a granel.

Por outro lado, ao degustarem a carne, os consumidores preferiram a carne maturada por 28 dias, principalmente devido a sua maior maciez. Por fim, pode-se concluir que maturações por períodos inferiores a 28 dias podem resultar em uma coloração mais atrativa ao consumidor mas em pouco melhorando a maciez. Por outro lado, maturações com períodos mais prolongados são necessários para que diferenças no sabor e aroma sejam perceptíveis aos consumidores.

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Autores:

Rodrigo Augusto Cortêz Passetti
Ivanor Nunes do Prado
Francisco de Assis Fonseca de Macedo

Por Equipe: Carne com Ciência

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